domingo, 1 de maio de 2011

Vinicius e minha adolescência


Há poetas que parecem fazer parte de nossas vidas desde sempre. Creio que Vinicius é um destes. Quando pequena, em minha casa ouvia-se tantas de suas canções que levei um tempo para descobrir os poemas. Adolesci com sua poesia, que me tomava pelos olhos, ouvidos e passeava por um corpo que pouco se sabia. Ansiava por um " amor infinito enquanto dure" e tinha certeza do " de repente, não mais que de repente". Juntava as amigas que amavam ler e recitar de forma teatral vezes e vezes os mesmos versos. Divertímo-nos imensamente com isso. Tínhamos um predileto que por sua força dramática permitia performances inesquecíveis.

Ausência

Eu deixarei que morra em mim o desejo de amar os teus olhos que são doces
Porque nada te poderei dar senão a mágoa de me veres eternamente exausto.
No entanto a tua presença é qualquer coisa como a luz e a vida
E eu sinto que em meu gesto existe o teu gesto e em minha voz a tua voz.
Não te quero ter porque em meu ser tudo estaria terminado.
Quero só que surjas em mim como a fé nos desesperados
Para que eu possa levar uma gota de orvalho nesta terra amaldiçoada
Que ficou sobre a minha carne como nódoa do passado.
Eu deixarei... tu irás e encostarás a tua face em outra face.
Teus dedos enlaçarão outros dedos e tu desabrocharás para a madrugada.
Mas tu não saberás que quem te colheu fui eu, porque eu fui o grande íntimo da noite.
Porque eu encostei minha face na face da noite e ouvi a tua fala amorosa.
Porque meus dedos enlaçaram os dedos da névoa suspensos no espaço.
E eu trouxe até mim a misteriosa essência do teu abandono desordenado.
Eu ficarei só como os veleiros nos pontos silenciosos.
Mas eu te possuirei como ninguém porque poderei partir.
E todas as lamentações do mar, do vento, do céu, das aves, das estrelas.
Serão a tua voz presente, a tua voz ausente, a tua voz serenizada.

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