sábado, 30 de abril de 2011

Camelos também choram


Deserto da Mongólia, um dos lugares mais inóspitos da terra. Floresce neste fim de mundo uma família guiada pela gentileza, ternura e respeito em todas as ações. Respeito pela camela que dá a luz e rejeita seu filhote. Todos se preocupam com a situação e procuram soluções. Existe um ritual apropriado para fazer com que a mãe se recupere e amamente o pequeno filhote. Para tanto faz-se necessário buscar um músico que mora num povoado distante dali. Partem os mais jovens para tentar trazê-lo. Tudo é preparado e na amplidão gélida a canção que transforma é entoada. Choram os camelos e todos que assistem choram também, por se lembrar vagamente de algo esquecido, algo perdido que toca profundamente na alma. Deserto pode ser um lugar onde se desligou da essência. A vida sempre bota do afeto e cuidado com que a tratamos.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Confissão

Pouco antes de morrer, aos 99 anos, minha avó me contou que sonhara com seu primeiro e, segundo ela, verdadeiro amor. Chamava-se Sebastião, como aquele rei português que desapareceu numa batalha e cuja volta messiânica foi esperada por séculos. Pois minha avó, cuja alma também era portuguesa, me confessou ter amado em silêncio aquele jovem por mais de 80 anos. Digo jovem porque assim ela o descrevia, rememorando cada momento que passaram juntos escondidos de meu bisavô. Fazendeiro rude, não queria ter filhas que pensassem em estudar e muito menos que escolhessem com quem casariam. Assim foi e Ana se casou com Antônio, com ele teve seus filhos, com ele trabalhou arduamente para sustentá-los, sempre o respeitando mas jamais amando. Quando ele morreu numa epidemia de tifo ela já tinha mais de 50 anos e não quis mais casar-se , apesar de por vezes sentir-se solitária. Agora próxima da última travessia sonhava com aquele amor perdido no tempo. Perguntei-lhe se alguma vez tivera alguma notícia dele, ela disse que nunca e que preferia mantê-lo assim, como havia sido, jovem, belo e apaixonado. Sabia que já deveria ter ido embora há muito. Não importava, dentro dela seguia o mesmo, amado até a sua morte.

quinta-feira, 28 de abril de 2011

Como atravessar desertos...


Se as histórias são vitaminas para a alma, esta é particularmente poderosa. Fala da entrega, da confiança e do desprendimento necessário para atravessarmos as paisagens mais inóspitas de nossa jornada. Ensinamento puro para nossos corações temerosos de se perder nas intempéries.
Idries Shah nos fala novamente.

A lenda das Areias

Vindo desde as suas origens nas distantes montanhas e após passar por inúmeros acidentes de terrenos nas regiões campestres, um rio finalmente alcançou as areias do deserto. E do mesmo modo como vencera as outras barreiras o rio tentou atravessar esta de agora, mas se deu conta de que mal suas águas tocavam a areia nela desapareciam.

Estava convicto, no entanto, de que fazia parte de seu destino cruzar aquele deserto, embora não conseguisse fazê-lo. Então uma voz misteriosa, saída do próprio deserto arenoso, sussurrou:

- O vento cruza o deserto, o mesmo pode fazer o rio.

O rio objetou estar se arremessando contra as areias, sendo assim absorvido, enquanto o vento podia voar, conseguindo dessa maneira atravessar o deserto.

- Arrojando-se com violência como vem fazendo não conseguirá cruzá-lo. Assim desaparecerá ou se transformará num pântano. Deve permitir que o vento o conduza a seu destino.

- Mas como isso pode acontecer?

- Consentindo em ser absorvido pelo vento.

Tal sugestão não era aceitável para o rio. Afinal de contas, ele nunca fora absorvido até então. Não desejava perder a sua individualidade. Uma vez a tendo perdido, como se poderá saber se a recuperaria mais tarde?

- O vento desempenha essa função – disseram as areias. – Eleva a água, a conduz por sobre o deserto e depois a deixa cair. Caindo na forma de chuva, a água novamente se converte num rio.

- Como é que posso saber que isto é verdade?

- Pois assim é, e se não acredita não se tornará outra coisa senão um pântano, e ainda isto levaria muitos e muitos anos; e um pântano não é certamente a mesma coisa que um rio.

- Mas não posso continuar sendo o mesmo rio que sou agora?

- Você não pode, em caso algum, permanecer assim – retrucou a voz. – Sua parte essencial é transportada e forma um rio novamente. Você é chamado assim ainda hoje por não saber qual é a sua parte essencial.

Ao ouvir tais palavras, certos ecos começaram a ressoar nos pensamentos mais profundos do rio. Recordou vagamente um estágio em que ele, ou uma parte dele, não sabia qual, fora transportada nos braços do vento. Também se lembrou, ou lhe pareceu assim, de que era isso o que devia fazer, conquanto não fosse coisa mais natural.

Então o rio elevou seus vapores nos acolhedores braços do vento, que suave e facilmente o conduziu para o alto e para bem longe, deixando-o cair suavemente tão logo tinham alcançado o topo de uma montanha, milhas e milhas mais longe. E porque tivera suas dúvidas o rio pôde recordar e gravar com mais firmeza em sua mente os detalhes daquela sua experiência. E ponderou:

- Sim, agora conheço a minha verdadeira identidade.

O rio estava fazendo seu aprendizado, mas as areias sussurraram:

- Nós temos o conhecimento porque vemos essa operação ocorrer dia após dia, e porque nós, as areias, nos estendemos por todo o caminho que vai desde as margens do rio até a montanha.

E é por isso que se diz que o caminho pelo qual o Rio da Vida tem de seguir em sua travessia está escrito nas Areias.


quarta-feira, 27 de abril de 2011

A trágica Medéia


Princesa da Cólquida, filha do Sol, sacerdotisa de Hécate. Quando se depara com o jovem heroi que chega ao palácio de seu pai para buscar o velocino de ouro parece ter sido atingida por uma flecha de Eros. Com as arte mágicas que domina como filha da Deusa ajuda Jasão a cumprir as tarefas impossíveis que seu pai havia proposto em troca do velocino. Para tanto faz o herói prometer que se casará com ela e a levará consigo. Ao perceber-se enganado, Eetes, se enfurece e tenta resistir à entrega do almejado prêmio. Mais uma vez ela interfere adormecendo o dragão que cuidava do velocino e ajudando na fuga até o famoso navio, Argo. Na fuga leva o irmão mais querido, o mata e joga seus pedaços no mar para atrasar seu pai que partira em perseguição aos fugitivos.
Assim continua a saga de Medéia, trágica feiticeira que não hesita em usar qualquer arma para ficar ao lado de seu homem escolhido. Chegando à Tessalia onde Jasão tomaria posse do trono, Pélias o rei que exigira como prova o velocino de ouro, recusa-se a entregar o poder. Ela, através de um estratagema mágico, faz com que as próprias filhas o esquartejem e cozinhem num caldeirão. Por este ato são obrigados a buscar asilo em Corinto.
Passa o tempo e Jasão profundamente incomodado com sua condição de exilado, resolve se casar com a filha do rei de Corinto para ascender a uma posição de poder. Nunca cumprira a promessa de se casar com a mulher que, neste ínterim, tivera dois filhos. Comunica a ela sua decisão com a salvação de todos os problemas. Os filhos seriam irmãos dos futuros herdeiros ao trono e protegidos de qualquer ataque. Havia apenas um detalhe: ela, Medéia, deveria partir.
Enfurecida , lembra ao canalha tudo o que fizera por ele, ao que Jasão retruca que nunca lhe pedira nada. Desolada, resolve levar a termo uma vingança exemplar: manda como presente à noiva um vestido magnífico. A jovem, deslumbrada, resolve vestí-lo na mesma hora. É consumida por um fogo que a transforma em cinzas, bem como seu pai , o rei de Corinto que a abraça tentando salvá-la. Não satisfeita destroi a última ligação com esta história nefasta: mata os dois filhos com as próprias mãos. Jasão termina sem nada e ela parte para o Egiro no carro de seu pai, o Sol, para tornar-se deusa.
Personagem controvertida, provoca as mais diferentes reações. Quem, entretanto, nunca cruzou com uma Medeia em seu caminho? Mulheres que colocam todos os seus recursos para terem e manterem um homem pra chamar de seu, mesmo que as custas do próprio valor. Mulheres que engravidam para segurar casamentos ou que usam os filhos para atingirem seus maridos. Chegando mais perto, quem nunca desejou apagar todos os rastros de um romance equivocado e seguir a vida sem arrependimentos? Atire a primeira pedra quem nunca cometeu desatinos por desamor.





terça-feira, 26 de abril de 2011

Vôo







Amanheci alada.
Passarinhei manhã adentro pelos galhos da Senhora,
Borboletei tarde toda nas pedras da cachoeira,
Pirilampei satisfeita pela noite estrelada,
Adormeci anjo,
Sonhei Alma,



segunda-feira, 25 de abril de 2011

Ensina-nos a contar os nossos dias...


Foi dada às mulheres a tarefa de contar os tempos. Os primeiros calendários eram baseados nas fases da Lua. Os chamados calendários lunares em que os meses tinham 28 dias. Como o ciclo menstrual feminino. Ciclos e estações determinavam o ritmo da vida. A percepção do tempo era dada pelas mudanças na cor das folhas, pela diminuição da luminosidade, enfim, pela observação de uma natureza também cíclica. Nestas eras, as mulheres cumpriam as tarefas mais ligadas à terra, quer seja coleta, quer seja o plantio. Fazia-se necessário conhecer os processos de transformação ao longo do tempo, o momento oportuno para cada coisa. O sangue mensal fazia parte deste calendário. Sua chegada marcava a entrada no mundo adulto e seu final, a entrada no mundo da sabedoria. Compreender tempos e processos era assunto vital para o bem estar e até para a sobrevivência de nossos ancestrais.
Há muito este conhecimento se perdeu para a maioria de nós. Observar as estações do ano, as fases da Lua virou coisa de esotéricos. A distância entre o humano e a natureza cresceu tanto que esquecemos que somos parte dela e sujeitos ao ritmos e ciclos que desrespeitamos constantemente. Se possível a gravidez hoje duraria menos e menstruação passou a ser tratada como mero desperdício. Cabe a nós seguir os ritmos digitais e sentirmos um desconforto por quase nunca estarmos em paz com o relógio. Ansiedade, impaciência, stress...Lutamos contra o tempo. Esquecidas, perdidas e um tanto equivocadas, caminhamos pela vida sem a percepção das mudanças. Reclamamos que atualmente o tempo passa mais rápido. Quem corre somos nós que nem sabemos na verdade que dia é hoje.

Imagem: Vênus de Laussel com chifre mostrando traços de uma marcação do tempo lunar.

quarta-feira, 20 de abril de 2011

Quando piso em folhas secas...


Certa feita encontrei um livrinho muito interessante sobre contos de amores e desamores, encontros e desencontros nas diversas culturas e mitologias. Gostei bastante e em especial desta história africana que relata o primeiro encontro entre um homem e uma mulher; o nosso velho amigo sapo tem um papel crucial. O livro já traz no nome as pequenas diferenças que nos distanciam e aproximam: contos da vontade dela e do desejo dele. Vamos, pois, a história...


As folhas secas

Deus criou pois o mundo, árvores, prados e florestas, animais de pêlo duro, pássaros, animais rastejantes. Após o que modelou um homem e uma mulher, construiu para ele uma cabana num campo na orla de um bosque, e para ela uma choças à beira de um riacho. Entre eles traçou um caminho. Mas nem um nem o outro o viu. Ambos estavam cegos. Seus olhos assemelhavam-se aos dos recém nascidos, com a porta das pálpebras ainda fechada. Assim viveram um momento, sem nada que os atraísse um para o outro, e Deus, durante todo esse tempo, pôde dormir sossegado.

Mas um dia, quando estavam pegando água diante de suas casas, veio-lhes no mesmo instante o mesmo sentimento irracional e persistente: no final do caminho reto que atravessava o matagal havia uma presença infinitamente preciosa para suas vidas, seus sonhos. Deus, vendo-lhes nascer o desejo, imaginou, em sua alta luz, que em breve um iria até o outro. Quis saber quem, homem ou mulher, daria o primeiro passo. Fez com que caísse uma chuva de folhas secas. "Quando eu as ouvir farfalhar", disse consigo mesmo, "acordarei. Verei quem está caminhando sobre elas, e portanto quem dos meus dois filhos é mais vulnerável à febre amorosa." Tendo assim pensado, foi deitar em seu leito de nuvens.

A mulher, naquela noite, saiu à porta de sua casa, e procurando aqui e ali alguma oisa para comer colocou por acaso a mão num sapo barrigudo. O animal cuspiu-lhe veneno nos olhos e, coaxando desesperadamente, saltou no meio das plantas da margem. a mulher, exasperada, esfregou o rosto. A unha do dedo mínimo arranhou-lhe os olhos. Sua pálpebras se abriram. Ela enxergou, espantou-se. Lá em cima havia um céu, em volta a terra, um rio cintilante, árvores, matas, mil cores fugidias, um velho sol poente no horizonte oeste, uma casa mais adiante, e na frente de seus pés descalços um caminho que levava até aquele lugar aprazível. Viu também as folhas secas. Pressentiu a armadilha divina. "Se eu for aonde quer o fogo que está me aguilhoando, o Velho Pai ficará sabendo", disse consigo mesma a finória. "Ora, eu preferia que ele nada visse." Sentou-se, pensou num meio de enganar as orelhas divinas, depois sorriu, maliciosa, e foi correndo encher um balde no riacho próximo, regou as folhas secas e amoleceu-as o suficiente para que não estalassem. Feito isso, foi , prudente e prestamente, na ponta dos pés à casa daquele que queria conhecer. Deus agitou-se no sono, resmungou e voltou aos seus sonhos.

A mulher achou o homem admiravelmente bem feito. Abriu-lhe os olhos com duas vigorosas unhadas. Ele achou a companheira exatamente igual àquela que lhe povoava os devaneios de cego. Ficaram emocionados, tocaram-se, tremeram tanto que se deitaram, tateando encontraram os caminhos desejados, gozaram, perguntaram-se como tinham podido viver sem os olhares, sem os rostos um do outro. de novo treparam. Finalmente a mulher disse num sopro maravilhado:
- Olha, o sol está nascendo. Deus não tardará a sair da cama, e eu não gostaria que nos surpreendesse aqui, juntos, um em cima do outro. Homem, tenho que partir. Amanhã à noite irás me procurar.
O homem viu a manhã pela primeira vez, viu sua longa sombra, viu-a encolher-se, viu o sol a pino secar as folhas mortas e novamente as sombras estendendo-se até o anoitecer. Finalmente viu a lua e seu rebanho de estrelas sair dos currais celestes. Calçou então as sandálias e cantarolando baixinho foi namorar.

Seu calcanhar esmagou pesadamente as folhas. Elas farfalharam, estalaram. Não deu importância, seu espírito estava inteiramente voltado para o novo prazer. Ouviu trovejar por cima de sua cabeça:
- Onde estás pois indo, meu filho?
O outro curvou as costas, colocou as mãos sobre o crânio.
- És tu - continuou a voz - o primeiro a sucumbir à febre do amor. Até o fim dos tempos, que assim seja. Irás até a mulher e a mulher esperará que lhe implores por amor.
- Mas, Senhor - arriscou o homem.
Não disse mais palavra. Estava apaixonado e temia para a amada o julgamento divino. Apenas ele, sabe que a mulher é sempre a primeira a querer. É seu desejo que tudo acende. "Olha-me", diz, e o homem vem a ela, e o Velho Pai, lá no alto, sorri em seu sono.

Gougand, Henri - O livro dos amores - São Paulo, Martins Fontes, 2001

terça-feira, 19 de abril de 2011

Origem

Houve um dia em que fui sonhada.
Minha mãe, mulher de tantos véus,
Perdida por entre as brumas da morte
Sonhou-me.
Tal sonho penetrou cada espaço de sua vida.
Era triste? Não o sei
Era amada? Dizem
Amava? Intensamente
Esta sua imensa possibilidade de amar,
Este anseio me foi transmitido nas
Gotas de seus fluidos.
Esvaziou-se da vida para parir seu sonho.
Eu, a sonhada.
Eu, o sonho.

Não a compreendi, em absoluto.
Senti o vazio,
Frio abandono em sua partida prematura.
Perscrutava desde cedo seus olhos nas poucas fotos.
Nada via...
Nada percebia...

Teceu-me ela para a vida,
Plena de dores, surpresas e descobertas.
Teceu-me, sobretudo, para o amor
Pelo qual tanto ansiou

Eu, sonho sonhado sonhei
Assim que meus olhinhos se abriram
Olhos velhos de quem espera
Espera o sonho
Por tantos cenários oníricos vivi
Sonâmbula
Incorpórea
Cresci esperando e desesperando

Certo dia, encontrei o sonho,
Não o reconheci de imediato,
Minha alma o sabia,
Tão distante
Tão palpável
Temi.
Por entre a torturante densidade
Do Destino fugi.
Adormeci.
Longo exílio
Anos e mais anos de aridez e desencanto,
Ilusões me prendiam,
Histórias vãs me comoviam.
Eu, perdida do sonho, vaguei
Como uma folha levada pelos ventos.

Mas minha mãe Maya sonhou.
Com a força de seu sonho
Entoou a canção através dos tempos.
Eu, enfim, acordei.
Acordei dentro do sonho,
O sonho para o qual fôra sonhada.
Tão real que todo o meu corpo vibrou
Transpassado pela vida
Estava lá
Sempre e sempre
Maio do que jamais pudera imaginar
Fascinante e belo
Aquele que me fôra reservado no
Pulsante peito da sonhadora:
O Amor!





segunda-feira, 18 de abril de 2011

O que realmente importa...


Estranha a vida! Transitória. Andamos pelo mundo como que eternos...Cair de cara no chão tem consequências. Faz repensar certezas. Apenas um tombo,mas que lembra que a qualquer momento podemos partir. Assim como há 14 anos meu irmão se foi... Saudades, lágrimas lembranças, luto, mas a vida se impôs e seguimos em frente.Deixou filhos que cresceram, tornaram-se pessoas maravilhosas e ele não viu. O mundo simplesmente continuou sem ele.
Nestas horas fica claro para mim que o que realmente importa são as relações. As pessoas que amo, que generosamente se desvelam em cuidar e com toda a gentileza do mundo mostram o quanto me querem bem . Muito nos preocupamos com o que temos ou deixamos de ter, com o que fazemos ou deixamos de fazer, mas o que fica é o que sentimos e o que sentem por nós. Cuidar com muito afeto das relações, torna-se prioridade. Se da vida nada se leva, podemos ao partir deixar um rastro de presença carinhosa. Terá feito toda a diferença.

domingo, 17 de abril de 2011

Acordando com Adélia


Quando fiz o curso de "dizedora" de poesia com a maravilhosa Elisa Lucinda, uma das poetas mais lidas foi Adélia Prado. Eu mesma, encantada com Pessoa que sou, comecei por um poema de Adélia. Simples e atenta aos detalhes sutis do cotidiano suspende o véu da dura realidade e cria mundos. Das pequenas flores do mato às escamas de um peixe a ser limpo, revela a beleza inerente a cada coisa. Caminha segura entre os céus e infernos do ser, sempre a conversar, questionar e louvar seu Deus. Alimento para a alma nesta bela manhã de domingo.

Cólera divina

Quando fui ferida,
por Deus, pelo Diabo, ou por mim mesma,
- ainda não sei -
percebi que não morrera, após três dias,
ao rever pardais
e moitinhas de trevo.
Quando era jovem,
só estes passarinhos,
estas folhinhas bastavam
para eu cantar louvores,
dedicar óperas ao Rei.
Mas um cachorro batido
demora um pouco a latir,
a festejar seu dono
- ele, um bicho que não é gente -
tanto mais eu que posso perguntar
Por que razão me bates?
Por isso, apesar dos pardais e das reviçosas folhinhas
uma tênue sombra ainda cobre meu espírito.
Quem me feriu perdoe-me.


sábado, 16 de abril de 2011

Uma história bela e trágica


Tenho amigos muito queridos que sempre descobrem filmes preciosos. Um dos últimos que me indicaram e emprestaram foi Ágora. Creio que não houve nenhuma exibição pelos cinemas por aqui. Trata da história de Hypatia, uma filósofa, astrônoma e matemática que viveu em Alexandria no seculo IV , quando do avanço do Cristianismo. Uma mulher, filha de um dos homens mais cultos de sua época , que teve acesso à educação e posteriormente espaço para ensinar e divulgar seus conhecimentos. Sua curiosidade e espírito cientifíco impressionam. Vive na época em que as ideias cristãs começam a se disseminar, inclusive a proibição de que mulheres pudessem falar em público e ensinar. Perseguida e caluniada tem uma morte trágica, mas seu pensamento adiantado para seu tempo, sobrevive a ela. Como disse um querido meu, como estaríamos hoje se a humanidade pudesse ter contado com o talento de todos os seu membros e não só da metade deles por tantos séculos?
.

sexta-feira, 15 de abril de 2011

Revelação

" Você é perfeita. Mas eu não te amo!", disparou ele à queima roupa no meio de um daqueles almoços de todos os dias. Falou como quem pensa alto e que não necessita de resposta do interlocutor. Ela, acometida por uma dor inesperada, ficou muda. Seu mundo parecia ter sido despedaçado por um ataque atômico. Como??? Passara sua vida inteira buscando ser a melhor possível: a mais amável, a mais inteligente, a mais gentil, a mais desejável, a mais...
Sempre acreditara que seria possível, com certos artifícios conquistar o mundo, inclusive o homem a quem amasse. Para tanto se dispusera a aprender tantas coisas , a procurar ser tantas coisas. Quando tal não acontecia tinha plena certeza de faltava algo nela, e que precisava ainda buscar ser mais e mais. Poderia ser que o próximo vestido, o próximo livro ou o próximo workshop lhe tornasse digna de amor. E ela se esforçava, ninguém poderia negar...
Ele, com a cruel frase de pesadelo, a libertou da terrível ilusão de que para ser amada teria que se superar e alcançar quase a divindade. Segue limitada e imperfeita, aprendendo que amar implica aceitar sua vulnerabilidade tão humana, com uma leveza de quem nada mais precisa, além de ser.

quinta-feira, 14 de abril de 2011

Arjuna e a Princesa Chitrangada



Existem histórias tão belas e comoventes que sempre que me deparo com elas não me contenho e me emociono deveras. Regina Machado, uma das melhores contadoras de histórias que conheço, escreveu um livro muito especial, repleto destes contos que tocam a alma. Parte do grande épico hindu, o Mahabharata, esta história traz uma princesa diferente, (não seriam todas belas?) que apaixona-se perdidamente pelo guerreiro Arjuna e conta com a intervenção da Deusa para viver este amor. A aparência pode até contar mas o verdadeiro amor reconhece a essência.

A Princesa que foi educada como um homem


Em Manapur existiu uma vez um rei que não teve nenhum filho homem. Como precisava de um herdeiro para o trono, resolveu educar sua única filha como se fosse um menino. A princesa Chitrangada não era bonita, muito pelo contrário. E como desde a mais tenra idade acostumou-se a manejar o arco e a flecha, a cavalgar pelos bosques com roupas masculinas caçando junto com os homens seus modos, costumes, gostos e sonhos nem de longe se assemelhavam ao que se esperaria de uma princesa de sangue real.
Naquele tempo, os Pandava tinham sido expulsos de seu reino pelos seus primos, os Kaurava, que tomaram o lugar dos primos banidos e se proclamaram reis. O grande guerreiro Arjuna era conhecido como o mais belo aventureiro dos Pandava, e seus feitos heróicos eram cantados por toda a parte. Enquanto as jovens do palácio de Chitrangada ficavam imaginando a beleza de Arjuna, a princesa só prestava atenção aos relatos de sua bravura e encantava-se com sua habilidade de atirar uma flecha com os olhos fechados e, ainda assim, acertar o alvo.
Mas, ao mesmo tempo, coisas horríveis aconteceram durante o exílio dos Pandava na floresta. Muitos bandidos se aproveitaram da briga entre os primos rivais e começaram a invadir e saquear as aldeias nas redondezas espalhando o terror por toda a parte. Para defender o reino de Manipur, Chitrangada montou seu cavalo e passou a comandar o pequeno exército de seu pai. Logo ela foi aclamada por sua coragem, por sua habilidade de guerreira, por sua perseverança. O povo a adorava e confiava nela cegamente. Os inimigos a temiam. O tempo foi passando e, enquanto as jovens do palácio realizavam suas festas de casamento, a princesa Chitrangada tornava-se cada vez mais hábil na caça, na luta, nas decisões no conselho de ministros e nos tribunais. Cada vez mais feia e embrutecida, ela não se lembrava, e ninguém se lembrava também, de que havia nascido mulher.
Um dia, cavalgando por um bosque acompanhada de alguns guerreiros, ela viu um homem dormindo à sombra de uma árvore, coberto dos pés à cabeça com seu manto. Sem descer do cavalo, ela cutucou o pé do homem com sua lança. Em um único movimento ele se levantou e armou sua flecha na direção de quem o havia atacado. Encontrou o olhar zombeteiro de Chitrangada que o encarava com um riso de deboche. Mas, em seguida, ele abaixou sua arma e disse simplesmente:
- Eu jamais lutarei com uma mulher, por mais que ela se pareça com um homem.
Enfurecida, ela retrucou:
- Com certeza você não é do meu reino, senão saberia que sou capaz de lutar melhor que um homem. Quem é você?
- Meu nome é Arjuna - ele respondeu tranquilamente.
- Arjuna, o Pandava, banido de seu reino? O grande heroi de quem tenho ouvido as aventuras mais inacreditáveis?
Chitrangada quase perdeu a respiração diante daquele que admirava mais do que ninguém no mundo.
- Eu mesmo - ele respondeu - E se você pretendia lutar comigo, pode perder as esperanças. Decidi viver como um ermitão durante um ano nesta floresta. Assim, nem com suas armas e muito menos com seus dotes femininos você seria capaz de me vencer - ele disse com um sorriso irônico, embrenhando-se pelo mato, desaparecendo rapidamente dentro da floresta.
Naquele momento, a princesa Chitrangada perdeu a noção do tempo e do espaço, da razão e do dever. Guiada pelo redemoinho de fogo que se apoderou de seu coração, galopou feito louca na direção do palácio, correu para seus aposentos e lá se trancou. Com gestos febris, suas mãos agitadas foram arrancando uma por uma suas roupas de homem. Ela procurou nos baús empoeirados as vestes e ornamentos que tinham sido de sua mãe, e foi se cobrindo desajeitadamente com um sári dourado, colares, anéis, pulseiras, enfeitou os cabelos e dirigiu-se para o espelho, cheia de ansiedade. A imagem que ela viu a deixou horrorizada.
- Como posso agradá-lo com meus encantos de mulher? Eu sou muito, muito feia - ela disse chorando, enquanto abraçava sua ama, que sempre cuidara dela, desde menina.
- Mas princesa, o que foi que aconteceu? Eu nunca a vi dessa maneira, tão desamparada. Você tem enfrentado os inimigos mais ferozes, vencendo todos os desafios com a bravura de um homem.
- É justamente essa bravura que não me serve de nada agora - disse a princesa soluçando - É o que menos vai me ajudar a conquistar o homem que amo.
- Se entendi direito, acho que posso ajudá-la - disse a ama docemente - Faça o que deve ser feito. Você precisa ir até o templo do Amor na entrada da floresta, e diante do altar pedir à Deusa que a torne bela, por um ano que seja.
a princesa parou de chorar e, animada com aquelas palavras, saiu correndo para o templo. Lá dentro não havia ninguém. Ela ajoelhou-se diante do altar e, com a cabeça voltada para o chão, disse baixinho:
- Por um ano, por um ano apenas, eu quero ser jovem e muito bonita.
Enquanto repetia seu desejo, sem cessar, ela foi se deixando embalar pela cadência de sua voz, pelo perfume das flores e do incenso espalhados pelo templo, e acabou adormecendo.
Quando um raio de sol iluminou seu rosto na manhã seguinte, ela abriu os olhos devagar e demorou um pouco para entender onde estava. A primeira coisa que sentiu foi uma vaga alegria. Uma leveza envolvia seu corpo e sua alma, sem que ela soubesse por quê. Ao apoiar a mão no chão para levantar-se, que mão era aquela, pequena, delicada e branca como a de uma donzela do palácio? Surpresa, ela caminhou até a fonte na entrada do templo. Maravilhada, demorou para acostumar-se com a mulher que viu refletida no espelho de águas límpidas. Aquela jovem vestida com o sári dourado e joias que realçavam suas formas perfeitas, encantadora e suave como um botão de rosa na primavera, era ela mesma?
A felicidade escapou de seu peito num canto delicado de agradecimento à Deusa. E a voz da princesa que cantava nem de longe lembrava o timbre áspero da guerreira Chitrangada.
A jovem foi se embrenhando para dentro da floresta, com o coração cheio de esperança. depois de um tempo ela encontrou Arjuna, sentado numa clareira, de olhos fechados meditando. O som dos guizos nos pés da jovem anunciaram sua presença, e Arjuna abriu os olhos. e o que aconteceu naquele momento, nem mil palavras de um contador de histórias seriam capazes de relatar direito. As juras de amor que Arjuna e a princesa Chitrangada trocaram, extasiados um com o outro, ficaram gravadas para sempre na terra daquele chão, no céu azul daquele lugar. Para sempre eles queriam ficar juntos. E desejaram que o tempo parasse.
Mas o tempo não parou. a princesa disse a Arjuna que se chamava Jaya. Com esse nome encantou-o como uma fada e amou-o como uma mulher durante dias, semanas, meses. ao mesmo tempo, enquanto vivia cada minuto de felicidade junto daquele homem magnífico, a princesa não se esquecia que o ano se escoava e que o dia de seu prazo final se aproximava cada vez mais.
Até que esse dia chegou e, quando Arjuna acordou, Jaya não estava ao seu lado. Lá fora ele ouviu vozes que se aproximavam da clareira onde moravam. de repente, chegaram muitas pessoas a pé, a cavalo, camponeses e soldados, procurando pela princesa Chitrangada. Eles traziam um enorme cavalo negro, ricamente ajaezado, e sobre a sela do cavalo, havia um arco, flechas e roupas de homem.
- O que vocês fazem aqui? - perguntou Arjuna.
- Depois que a nossa princesa desapareceu - respondeu um homem - os bandidos têm incendiado nossos campos e nossas aldeias. Nós precisamos encontrá-la, antes que eles cheguem à capital do reino. Só ela poderá nos salvar, como sempre fez antes de seu desaparecimento.
Ele não conseguiu terminar de falar, pois um murmúrio exaltado tomou conta de todos. Eles olharam na direção da gruta, levantaram os braços agitados e gritaram:
- Chitrangada, finalmente a encontramos!
Arjuna virou-se e viu uma mulher horripilante, ossuda e desengonçada, vestida com um sári dourado.
- Quem é você? - perguntou - Nessa gruta vivo com Jaya, minha mulher. Onde ela está?
Com uma voz grave e áspera, Chitrangada respondeu:
- Ela continua viva, no fundo do meu coração.
E sem dizer mais nada, ela olhou Arjuna com os mesmos olhos negros e brilhantes que iluminavam o rosto de Jaya, e correu para seu cavalo. Vestiu as roupas de homem que a esperavam, saltando sobre a sela, Então Arjuna lembrou-se daquela mulher guerreira que uma ano atrás o havia desafiado cutucando seu pé com a lança.
A princesa esporeou o cavalo e saiu em disparada enquanto as pessoas a aclamavam. Arjuna montou em outro cavalo e a seguiu. Juntos combateram com bravura e venceram os exércitos dos bandidos. Nas aldeias, o povo festejou por dias seguidos, com danças e cantos. Enquanto Arjuna e a princesa retornavam lado a lado pelo caminho, chegavam à beira da floresta onde tinham vivido por um ano inteiro.
Arjuna entendeu que continuava a amá-la, e estendeu a mão para que juntos entrassem na floresta. A princesa Chitrangada sorriu, com os mesmos olhos negros e brilhantes que Arjuna conhecera no rosto de Jaya e lhe disse:
- O que resta da bela mulher que viveu na gruta dom você é o mais importante. Aquilo que está guardado dentro do nome Jaya, que quer dizer "vitória".
Na verdade, ela já nem era mais tão feia quanto antes.

Machado, Regina "O violino cigano e outros contos de mulheres sábias" São Paulo, Companhia das Letras,2004


quarta-feira, 13 de abril de 2011

Hécate, a Senhora das Sombras


Hécate, a senhora das encruzilhadas. Deusa ancestral nascida do encontro de Gaia e Urano, o céu e a terra. Grande Deusa por excelência, era honrada por Zeus que lhe permitiu manter os poderes sobre o mar, os céus e a terra . Sempre associada à Lua e às sombras passou a ser vista como a protetora das magias e feitiços. Em algumas histórias aparece como a mãe de Circe e Medéia, poderosas e perigosas feiticeiras. Ajudou Deméter quando do desaparecimento de Perséfone, demonstrando desvelo e compaixão.
Divindade muito ligada ao feminino, cuida dos nascimentos e mortes, auxilia na visão dos ciclos e tempos. Consegue olhar para o passado e o futuro sem perder-se da ação presente. Deusa da transformações , ajuda as mulheres a atravessar seus ritos de passagem especialmente no cessar do sangue, a menopausa. Senhora da Noite pode acompanhar processos de profunda interiorização e solidão criativa da alma, iluminando com suas tochas e indicando novos caminhos para a jornada.
Profundamente amada e venerada a Velha Senhora oferece proteção e visão aquelas que a buscam.

terça-feira, 12 de abril de 2011

Pedido à Afrodite


Que a grande Senhora, amorosa e plena,
Conceda aos amantes o Encontro,
Conceda aos corpos o Leito,
Conceda aos sonhadores a Realização.
Que os mares se agitem!
Que o fogo recrusdesça!
Que os ventos se manifestem!
Que a terra trema!
E meu amor retorne!






segunda-feira, 11 de abril de 2011

Felicidade é...


Quando estava fazendo mestrado cursei uma disciplina de cunho mais filosófico com uma professora muito querida, a Iray Carone, que era irmã do tradutor brasileiro do Kafka, o Modesto. Família de intelectuais, Iray era uma estudiosa de Marx e quem me iniciou na leitura de um dos livros mais comentados e menos lidos, "O Capital".
A disciplina da qual estou falando, porém, tratava da busca da felicidade. Assunto discutido exaustivamente por vários autores a começar por indagar sobre o que seria a tal felicidade e como encontrá-la.
Um dos grandes, Aristóteles, postulava que só a sensação do dever cumprido, da ação correta poderia ser nomeada como felicidade. Cumprir a missão. Algo que deveria ser ligado ao coletivo, ao bem comum. Já meu respeitado "Pai", o Freud ,diz que é a "satisfação, de preferência repentina, de necessidades represadas em alto grau". Quanta diferença! Do cumprimento do dever no coletivo para a satisfação de desejos individuais. Como conciliar visões tão díspares?
Fomos contaminados pela ideia de que podemos adquirir felicidade. Comprar ou conquistar objetos e chegar enfim a um estado de satisfação plena e de poder ilimitado. Ledo engano. Se felicidade é satisfação de desejos e o desejo é por natureza impossível de ser satisfeito...
Temos que seguir buscando aquilo que nos faz sentido . Trabalho árduo de ir além das opiniões e soluções da cultura. Pensar, questionar, experimentar, sentir, doar... Nada tão simples como abrir uma Coca-Cola.





domingo, 10 de abril de 2011

Clarice e uma sereia...


Amo Clarice Lispector. Certa feita ganhei um livro de uma amiga e o deixei guardado por tempos na estante. Adoro descobrir livros "esquecidos" pois sempre tenho a sensação de que aparecem na hora mais necessária. Este em especial fala do amor entre uma "sereia", Loreley e Ulisses, um arguto professor de filosofia. Trata dos medos da entrega, da descoberta de um outro totalmente diverso, da possibilidade da palavra como criadora de pontes entre mundos. Foi uma leitura intensa e transformadora. "Uma Aprendizagem ou O livro dos Prazeres" passou a ser parte importante de minha Constituição interna.


Oração de Loreley

Alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para que eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana para apertar a minha, amém.



sábado, 9 de abril de 2011

Eternas repetições


Um monge e um menino isolados numa paisagem de sonho. Assim começa " Primavera, Verão, Outono, Inverno, Primavera". O nome já denuncia , o filme fala dos ciclos da vida e das impossibilidades humanas de transcender aos apelos de seus desejos. Apesar do isolamento os personagens são visitados por toda a força das paixões que movem a existência .
Permeado de conceitos budistas, mostra que a violência gratuita e aparentemente ingênua nunca ficará sem consequências e que o apego pode dar origem à destruição.
Contemplativo, por excelência, comove pela beleza e pela inevitabilidade do drama de estar-se preso indefinidamente numa roda de repetições.

sexta-feira, 8 de abril de 2011

"Meus olhos se viram no seu olhar"

Ela tinha belos olhos que brilhavam intensamente quando por alguma felicidade repentina.Foi precisamente estes olhos encantados que ao conhecê-la tocaram o coração dele. Se eram brilhantes, para ele surgiram com a força de um novo Sol. Até aquele momento do Encontro sentira-se um tanto insignificante, mas ao ver-se refletido naqueles espelhos límpidos vislumbrou-se Rei e deles se enamorou perdidamente. Ela, por sua vez, sentiu que chegara o momento que tanto esperara para enfim, amar alguém de corpo e alma.
Viveram felizes por uns tempos...
Ele aos poucos se acostumou a ser visto como mais do que se sentia e começou a se imaginar tão grandioso quanto os olhos dela lhe mostravam. Resolveu sair pelo mundo para testar seus novos poderes. Foi tanto trabalho a fazer, tanto atraso, tanto esquecimento, tanta desculpa, tanta desatenção...Voltava sempre para os bons olhos que a tudo pareciam perdoar.
Ela a nada compreendia, esperava dias que não voltavam e chorava, lamentava em silêncio sua solidão cinzenta. Seus olhos ficaram baços, mas sempre ansiavam por aquele que acreditava lhe trariam a antiga luz. Um restinho de brilho era reservado para ele que acabava por voltar necessitado de sua imagem cintilante para continuar suas aventuras.
Certo dia ela percebeu-se com uma vontade imensa de visitar outras terras, de deixá-lo para trás, de não mais esperar por dias que não mais voltariam. Assim fez e seus belos olhos voltaram ávidos a contemplar novos e velhos mundos. Alimentaram-se de belezas e amplidões... Sem se dar por isso retomaram seu esquecido esplendor.
Quando se reencontraram, ele pressentiu que algo havia mudado, não saberia precisar o quê. Um vazio foi se instalando sorrateiro. Era o fim. Ela não mais o olhava com aquele fascínio que o alimentara por tantas aventuras. Partiu só e opaco como sempre havia sido.
Ela, sentada às margens do Sena, toma preguiçosamente seu café e sorri...

quinta-feira, 7 de abril de 2011

Fátima, a Fiandeira


Existem histórias de todo o tipo, alegres para melhorar o humor, tristes para tocar alma e aquelas que são "pra levantar os mortos", ou seja, que trazem tanta força e ensinamento que comovem nossos recantos mais profundos e nos lembram de que aos humanos é dada sempre a oportunidade de aprender e ir além dos obstáculos. Uma das primeiras que ouvi e que como Clarissa Pínkola diz é um "fortificante" potente para nossa caminhada. Está na coletânea compilada por Idries Shah, "Histórias da Tradição Sufi".

Numa cidade do mais longínquo Ocidente vivia uma jovem chamada Fátima, filha de um próspero fiandeiro. Um dia seu pai lhe disse:
- Filha, faremos uma viagem, pois tenho negócios a resolver nas ilhas do Mediterrâneo. Talvez você encontre por lá um jovem atraente, de boa posição, com quem possa então se casar.
Iniciaram assim sua viagem, indo de ilha em ilha; o pai cuidando de seus negócios, Fátima sonhando com o homem que poderia vir a ser seu marido. Mas um dia, quando se dirigiam a Creta, armou-se uma tempestade e o barco naufragou. Fátima, semi-consciente, foi arrastada pelas ondas até uma praia perto de Alexandria. Seu pai estava morto, e ela ficou inteiramente desamparada.
Podia recordar-se apenas vagamente de sua vida até aquele momento, pois a experiência do naufrágio e o fato de ter ficado exposta às inclemências do mar a tinham deixado completamente exausta e aturdida.
Enquanto vagava pela praia uma família de tecelões a encontrou. Embora fossem pobres, levaram-na para sua humilde casa e ensinaram-lhe seu ofício. Desse modo Fátima iniciou nova vida e, em um ou dois anos, voltou a ser feliz, reconciliada com sua sorte. Porém um dia, quando estava na praia, um bando de mercadores de escravos desembarcou e levou-a, junto com outros cativos.
Apesar dela se lamentar amargamente de seu destino, eles não demonstraram nenhuma compaixão: levaram-na para Istambul e venderam-na como escrava. Pela segunda vez o mundo da jovem ruíra.
Mas quis a sorte que no mercado houvesse poucos compradores na ocasião. Um deles era um homem que procurava escravos para trabalhar em sua serraria, onde fabricava mastros para embarcações. Ao perceber o ar desolado e o abatimento de Fátima, decidiu comprá-la, pensando que poderia proporcionar-lhe uma vida um pouco melhor do que teria nas mãos de outro comprador.
Ele levou Fátima para casa com a intenção de fazer dela uma criada para sua esposa. Mas ao chegar em casa soube que tinha perdido todo o seu dinheiro quando um carregamento fora capturado por piratas. Não poderia enfrentar as despesas que lhe davam os empregados, e assim ele, Fátima e sua mulher arcaram sozinhos com a pesada tarefa de fabricar mastros.
Fátima, grata ao seu patrão por tê-la resgatado, trabalhou tanto e tão bem que ele lhe deu a liberdade, e ela passou a ser sua ajudante de confiança. Assim ela chegou a ser relativamente feliz em sua terceira profissão.
Um dia ele lhe disse:
- Fátima, quero que vá a Java, como minha representante, com um carregamento de mastros; procure vendê-los com lucro.
Ela então partiu. Mas quando o barco estava na altura da costa chinesa um tufão o fez naufragar. Mais uma vez Fátima se viu jogada como náufraga em uma praia de um país desconhecido. De novo chorou amargamente, porque sentia que nada em sua vida acontecia como esperava. Sempre que tudo parecia andar bem alguma coisa acontecia e destruía suas esperanças.
- Por que será – perguntou pela terceira vez - que sempre que tento fazer alguma coisa não dá certo? Por que devo passar por tantas desgraças?
Como não obteve respostas, levantou-se da areia e afastou-se da praia.
Acontece que na China ninguém tinha ouvido falar de Fátima ou de seus problemas. Mas existia a lenda de que um dia chegaria certa mulher estrangeira capaz de fazer uma tenda para o imperador. Como naquela época não existia ninguém na China que soubesse fazer tendas, todo mundo aguardava com ansiedade o cumprimento da profecia.
Para ter certeza de que a estrangeira ao chegar não passaria despercebida, uma vez por ano os sucessivos imperadores da China costumavam mandar seus mensageiros a todas as cidades e aldeias do país pedindo que toda mulher estrangeira fosse levada à corte.
Exatamente numa dessas ocasiões, esgotada, Fátima chegou a uma cidade costeira da China. Os habitantes do lugar falaram com ela através de um intérprete e explicaram-lhe que devia ir à presença do imperador.
- Senhora – disse o imperador quando Fátima foi levada até ele, - sabe fabricar uma tenda?
- Acho que sim, Majestade – respondeu a jovem.
Pediu cordas, mas não tinham. Lembrando-se dos seus tempos de fiandeira, Fátima colheu linho e fez as cordas. Depois pediu um tecido resistente, mas os chineses não o tinham do tipo que ela precisava. Então, utilizando sua experiência com os tecelões de Alexandria, fabricou um tecido forte, próprio para tendas. Percebeu que precisava de estacas para a tenda, mas não existiam no país. Lembrando-se do que lhe ensinara o fabricante de mastros em Istambul, Fátima fabricou umas estacas firmes. Quando estas estavam prontas ela puxou de novo pela memória, procurando lembrar-se de todas as tendas que tinha visto em suas viagens. E uma tenda foi construída.
Quando a maravilha foi mostrada ao imperador da China ele se prontificou a satisfazer qualquer desejo que Fátima expressasse. Ela escolheu morar na China, onde se casou com um belo príncipe, e, rodeada por seus filhos, viveu muito feliz até o fim de seus dias.
Através dessas aventuras Fátima compreendeu que o que em cada ocasião lhe tinha parecido ser uma experiência desagradável acabou sendo parte essencial para a sua felicidade.

quarta-feira, 6 de abril de 2011

Sobre Deusas


"As imagens do mito são reflexos das potencialidades espirituais de cada um de nós. Ao contemplá-las, evocamos os seus poderes em nossas próprias vidas". Joseph Campbell

Desde muito pequena tenho uma fascinação respeitosa pelos mitos, talvez por ter sido criada dentro de um sistema de crenças altamente simbólico(apesar de seus representantes o apresentarem como verdade última). Os primeiros deuses que conheci, para além do meu grande Pai, foram os gregos que povoaram minha infância com suas intrigas e disputas.
Posteriormente descobri que existem tantas mitologias, cosmogonias e compreensões de mundo que, baseadas na múltiplas experiências dos diferentes povos, podem ampliar nossa visão da existência. Encantei-me pelas representações femininas do Sagrado. As primeiras imagens do Divino foram pequenas esculturas de uma deusa ancestral com seios enormes e um grande ventre de onde provém toda a vida.
Sendo, segundo Campbell, os mitos baseados nos eventos e nas energias no próprio corpo, a observação simples de uma gestação e parto, deu origem à visão de que o feminino é o gerador da vida e portanto a divindade maior para estes povos seria a grande Mãe, venerada por muitas culturas na antiga Mesopotâmia, no Egito e por vários povos agrícolas. Ao mesmo tempo que cria a vida, seu próprio corpo passa a ser o Universo. Tudo se move dentro dela. Não há separação, palavra intrínseca a um regime patriarcal.
São muitas Deusas e muitas manifestações deste Sagrado feminino. Podem trazer à superfície aspectos sombrios e necessários, como Hécate, Kali e outras madonas negras, podem nos lembrar de características guerreiras como Sekhmet, Athená e Durga, ou ressaltar aspectos da compaixão como Ísis, Kuan Yin e Tara. Em qualquer de suas formas, ao nos chegarmos mais perto somos tocados por uma luminosidade diferente, por uma sensação de um retorno às origens, por uma revelação iminente de nossa própria Essência.
Que a grande Mãe sempre te visite!!!











terça-feira, 5 de abril de 2011

Dedicatória num livro do Rubem Alves


Tu me dizes que os poetas falam de amores inexistentes.
Pena...
Eu sempre os acreditei tradutores da alma,
Resvalam no sublime mesmo que não consigam
Manifestar toda a sua beleza.
Eles, os poetas, são amantes das palavras,
Capturam o sentir no verso,
Deixam desejos suspensos nas pausas.
Nós, reles mortais que somos, vivemos sonâmbulos
Imersos nesta bela e grandiosa viagem.
Que o amor acenda tua Lua!

segunda-feira, 4 de abril de 2011

Gratidão a um grande amigo


Seu nome era Elias, nome de profeta e de visionário. Acreditava nas potencialidades humanas e na ampliação da consciência que pode acontecer através de encontros verdadeiros e profundos. Eu o conheci quando ainda estava na faculdade. Estranhava aquele ser exótico que passeava distraído pelos corredores da Psico. Sentia ao mesmo tempo fascínio e medo. Não sabia precisar a causa.
Chegou o dia em que ele me mandou convidar para um de seus Encontros Transcentrados. Fui meio que obrigada e apavorada. Mal sabia que minha vida tomaria um novo rumo de compreensão a partir daquela experiência. Ele, como facilitador, permitia um silêncio infinito e por vezes, angustiante. Não era necessário falar, nem havia nenhuma proposta prévia de tarefa. Num primeiro momento achei meio bobo ficar ali sentada no meio de pessoas que não conhecia. Mas aos poucos me acostumei a ideia e passou a ser confortável. Hoje relembrando não sei o que me transformou, mas creio que o cuidado, o carinho e a aceitação que o Elias demonstrava foram cruciais para que eu me permitisse alargar meus limites.
Tornamo-nos muito amigos. Acompanhei de perto sua jornada de pesquisador da psique. Foram muitos os Encontros, muitas festas à fantasia, muitas conversas... Trouxe para minha vida pessoas mais que amadas, irmãs de alma. Trouxe paisagens e histórias. Ajudou-me a enxergar mais e melhor.
Adoeceu de repente e de repente se foi, dizendo que não tivera medo de nenhuma aventura em vida e que queria estar bem presente para experimentar esta última travessia.


Meu querido amigo,
Tão amado, que num carro de fogo,
Subiu aos céus.
Eu te agradeço pelo prazer de tua
Presença e companhia,
Pela trilha compartilhada,
Pelos desencontros e,
Por todo este Encontro.
Agradeço pela Transformação,
Pela Dança,
Pela História,
Pelo Eclipse,
Pelo Cálice,
Pela Chuva.
Agradeço pela Alegria de ter caminhado contigo,
Pela herança de Amor que permanece.
Que Transpassado e Transformado
Compreenda o Caminho, a sabedoria e a Luz.
Vá meu querido para os braços do Amado
e que a Mãe te receba.



domingo, 3 de abril de 2011

Uma benção da Velha Senhora


Existem mundos e mundos..Para fazer a travessia entre eles são colocados portais. Desde muito pequena um dos meus maiores interesse é descobrir tais passagens. Um dos mais primeiros que encontrei foi sonhar. Sonhar quando se dorme : atravessar tempos, paisagens e encontrar pessoas desconhecidas de dentro e de fora. Talvez seja por isso que sempre fui uma dorminhoca por excelência.
Em seguida descobri os livros e uma infinidade de caminhos se abriram para mim. Gosto especialmente de encontrar escritores portais. Surpreendentes, inusitados e criadores de alma nos mais insuspeitados cantos. Uma de minhas prediletas, como já devem ter percebido, é minha querida Clarissa Pínkola. Fala sempre de morte e vida, de ciclos e florestas selvagens.
Em seu livro "A Ciranda das Mulheres Sábias" ela se detém no arquétipo da velha sábia que existe dentro de cada mulher e que ajuda à jovem em momentos de crise e esquecimento. Como uma velha e boa avó que cuida, nutre, ensina os caminhos e abençoa as jornadas. Nada como atravessar os mundos abençoada pela Velha Senhora.

" Uma benção não faz com que você ganhe alguma coisa, mas , na verdade, faz com que você use
alguma coisa - algo que você já possui - o dom que nasceu junto com você no dia em que chegou à Terra. Uma benção é para que você se lembre totalmente de quem é, e faça bom uso da magnitude que nasceu embutida no seu eu precioso e indomável.

...Que você sempre se lembre de estar conectada à alma, se for visão e força o que deseja,
...e de estar conectada ao espírito, se for energia e determinação que necessitar para agir pelo seu próprio bem e pelo mundo,
...e, se for sabedoria o que quiser, que você sempre una o espírito à alma, ou seja, uma a ação à paixão, a ousadia à sabedoria, a energia à profundidade...e convide todos os aspectos da psique para o hierosgamos, esse matrimônio sagrado.
...Assim, filha querida, anime-se e inspire-se.
...Assim, que você escolha o que tornar maior, não menor, seu coração, sua mente e sua vida,
...que você absorva o que tornar mais profundos, não mais amortecidos, seu coração, sua mente e sua vida,
...que você escolha o que a faça dançar, não mais andar pesadamente nem cochilar, pelo tempo afora.

Há quem diga que bençãos são apenas palavras. Mas, minha filha, tendo em vista sua esperança, sua capacidade para amar, seu anseio pela alma e pelo espírito, sua carga criativa, seu interesse e fascínio por viver a vida plenamente, essa benção para você não é só 'palavras'. Digo-lhe que esta benção é profecia."

"Quando uma pessoa vive de verdade, todos os outros também vivem"



sábado, 2 de abril de 2011

Sexo por Compaixão


O filme começa em preto e branco. Como é sem cor a vida das pessoas naquela árida aldeia perdida no nada. Uma comunidade estéril. A única criança ficou muda ao presenciar um suicídio. Dentro desta paisagem caminha Dolores, uma mulher profundamente apaixonada e devotada ao marido, que lhe abandona por ser ela boa demais. Generosa ao extremo, a todos ajuda : tira fotografias diárias de uma velha senhora presa ao leito, cuida da vaca de estimação de uma solteirona, conversa com carinho com a silenciosa criança. Sofre com a ausência do marido e busca respostas na igreja. O padre, entretanto, não consegue ajudá-la pois acaba por se irritar com tanta bondade e inocência.
A mulher resolve então que tem que descobrir uma forma de pecar. Quando ouve um marido traído chorar sua desilusão deita-se com ele para consolá-lo. Com seu novo nome, Lolita, passa a oferecer aos homens que por ali passam seu leito e compreensão. Esta entrega provoca grandes mudanças até que a cor e a vida retornem a fazer parte do cotidiano daquela aldeia.
Sensível e divertido, o filme subverte algumas certezas sobre piedade e ascetismo sexual. Aqui sexo pode até se tornar um portal para a "santidade".






sexta-feira, 1 de abril de 2011

Pausa para nossos comerciais



DIÁLOGOS FEMININOS
" a grande e interminável conversa de mulheres sustenta o mundo em sua órbita...se não se falassem as mulheres umas às outras, os homens já teriam perdido o sentido da casa e do planeta"
José Saramago
Retomando nossa jornada nos Diálogos Femininos decidimos revisitar algumas das deusas e princesas que trazem à luz o cerne daquilo que acreditamos necessário para mudar o mundo. O nosso mundo.
Através da troca de histórias e experiências buscamos traçar juntas um mapa para que ampliemos nossas possibilidades de compreensão e consciência de uma vida mais plena. O primeiro dos encontros será:

Quando Perséfone visita a Bela Adormecida

Uma deusa sombria encontra uma jovem princesa. Parecem conversar no mundo dos sonhos. Mítico e simbólico. Em que medida esta conversa pode afetar nossas vidas e transformá-las? O que Perséfone e as duas Belas Adormecidas (são duas!!!) tem a nos dizer hoje, mulheres desse século XXI?
Esse Encontro se dará no dia 16 de abril das 9:30 às 13:30.
Local: Rua Delfina, 74 - Vila Madalena
Custo: R$ 120,00
Maiores informações - 3082 6394/8382 6222 ou pelo email
É NECESSÁRIO CONFIRMAR PRESENÇA ATÉ O DIA 13 DE ABRIL

COORDENADORAS
Cassia Simone: psicoterapeuta de orientação junguiana, contadora de hisstórias, coordenadora de círculo de mulheres e estudiosa de mitologia e questões do feminino
Cris Balieiro: psicoterapeuta de orientação junguiana, coordenadora de círculo de mulheres e estudiosa de mitologia e questões do feminino e autora do livro O FEMININO E O SAGRADO - Mulheres na Jornada do Herói (Edit. Ágora, 2010)

O desenho " As princesas do espelho" é de autoria de Cris Balieiro

Sobre mentiras

Há alguns anos eu e minha grande amiga e parceira em muitos trabalhos, preparamos um workshop com o título ; "Mentiras que nos contaram (ou nos contamos) sobre a vida e os relacionamentos". Coisa simples e tranquila...Como gostamos muito de fazer. Conheci a Cris Balieiro num grupo de estudos da obra de Joseph Campbell. Percebemos rapidamente que tínhamos muito em comum (líamos enciclopédias quando pequenas!) e uma singela ambição: mudar o mundo. Criamos juntas um círculo de mulheres e os Diálogos Femininos que já renderam muitas transformações. Recebemos o merecido título de Professoras de Dúvidas.
Mas voltando às mentiras. Vivemos despreocupadamente baseados em crenças das quais não nos damos contas. Certezas que norteiam nossas vidas e que cultivamos com carinho sem perceber que roubam nossa vitalidade e criatividade. Somos apresentados a uma visão de mundo que raramente questionamos. Recebemos indicações do que devemos fazer para sermos felizes e bem sucedidos e logo somos frustrados, mas não queremos muitas vezes o trabalho de suspender as "verdades".
Nos relacionamentos criamos ideais e padrões do que seria esperado de nós e do outro que jamais se cumprem e seguimos iludidos ou resignados. Uma das crenças mais acalentadas é a de que o amor a tudo transforma e é condição suficiente para resolver todos os problemas. Quanta devastação pode surgir desta ilusão? Quanta dor, desrespeito e até morte podem vir desta certeza?
O trabalho de desconstrução é árduo e exige coragem. Vasculhar cantos e jogar fora ideias, ilusões e certezas causa muita angústia. Mas que compensa, isto compensa...Viver sem fardos de que não precisamos mais nos abre possibilidades insuspeitadas e caminhos novos para sermos aquilo que podemos ser.



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