domingo, 29 de maio de 2011

O Credo de Elisa Lucinda


Amo poesia. Desde muito pequena. Na tradição religiosa onde fui criada, saber poesia era parte integrante de nossos rituais. Não só religiosa (talvez não percebessem o poder subversivo e libertador!), mas aprendíamos a recitar poemas para ocasiões especiais como Natal, Dia das Mães etc . Quem me ensaiava era minha tia e tínhamos brigas homéricas sobre a melhor maneira d e apresentar os versos. Ela propunha que me fizesse compreender por largos gestos e teatrais modulações de voz. Histriônico ao extremo. Eu preferia algo mais contido e mais voltado para o sentido da palavra. Obviamente não tinha recursos para explicar isto na época. Na hora H fazia meio lá, meio cá. Todos gostavam, mas eu sabia que tinha um jeito melhor.
Muitos e muitos anos mais tarde fui convidada por um amigo para conhecer Elisa Lucinda e seu curso de dizedores de poesia. Que delícia descobrir que existia uma forma mais fluida, mais próxima do sentir que eu tanto buscara em criança. Elisa é poeta, atriz, cantora e diva. Magnífica. A poesia salta dela como de uma fonte inesgotável. E comove. E ilumina. E transforma. Foram tardes eternas ouvindo poemas de diferentes tons. Geovana e Emilene, professoras como Elisa nos faziam repetir a exaustão até que o poema tomava forma dentro de nós e fluía sem interpretações exageradas, mas carregadas de sentimento.
Na apresentação final, num grande teatro cheio de gente e expectativa todos os alunos reluziam com seus poemas encarnados. Passamos a fazer nosso o Credo que compôs nossa mestra...






Credo

De tal modo é,
que eu jamais negá-lo poderia:
sou agarrada na saia da poesia!
Para dar um passeio que seja,
uma viagem de carro, avião ou trem,
à montanha, à praia, ao campo,
uma ida a um consultório
com qualquer possibilidade, ínfima que seja, de espera,
passo logo a mão nela pra sair.
É um Quintana, uma Adélia, uma Cecília, um Pessoa
ou qualquer outro a quem eu ame me unir.
Porque sou humano e creio no divino da palavra,
pra mim é um oráculo a poesia!
É meu tarô, meu baralho, meu tricot,
meu i ching, meu dicionário, meu cristal clarividente, meus búzios,
meu copo d'água, meu conselho, meu colo de avô,
a explicação ambulante para tudo o que pulsa e arde.
A poesia é síntese filosófica, fonte de sabedoria, e bíblia dos que,
como eu, crêem na eternidade do verbo,
na ressurreição da tarde
e na vida bela.
Amém!


Um comentário:

Nelson disse...

Adorei ...

Beijos

Nelson

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