domingo, 6 de fevereiro de 2011

Identidade

Certo dia acordei cismando com a estranheza de meu sobrenome. Assunto que quando criança me tomava de tempos e tempos. Cresci ouvindo grandes elogios ao caráter, honra e graça dos Ferreira, família a qual supostamente deveria pertencer. Como pois vim a me chamar Silva?
Confesso que nunca me senti à vontade com este nome tão genérico, mas era o que me cabia. Até eu me deter na razão de não ser chamada pelo nome de família e me intrigar com a origem do tal Silva que me acompanhava. Ancestrais todos idos, como sabê-lo?
Pensei que meu último antepassado querido deste lado poderia me esclarecer. Liguei imediatamente e soltei a pergunta à queima roupa. Meu velho tio divertiu-se muito, riu bastante até que depois de fazer prometer discrição narrou a seguinte história:
Quando jovens ele e seus irmãos, meu avô arrendou terras de um fazendeiro. A família toda trabalhava arduamente na terra. O proprietário da fazenda era também o pai de uma linda moça: : " Uma morena danada de linda!". Um de meus tios enamorou-se perdidamente por ela. Meu pai, que em tudo imitava o irmão, encantou-se também. Creio que na época todos perceberam os olhares famintos de meu tio. Por onde ele passava todos comentavam: "Lá vem o Evaristo Ferreira da Sílvia!" Se chegavam a um baile ou festa como tocadores de viola e cantadores que eram, a cena se repetia. Meu tio, entre constrangido e orgulhoso, estufava o peito e alegrava-se por ter a amada como epíteto.
Certo é que chegou a hora de fazerem seu registro de identidade. Naqueles tempos perdidos de nosso Brasilzão, podia-se colocar o nome que se quisesse. Imaginem que poderia Drumond de Andrade, Machado de Assis ou coisa assim...Ou mesmo Procópio Ferreira que era realmente o nome da família. Não! Meu tio orgulhosamente escolheu: Evaristo Ferreira da Silva. Meu pai demonstrando o grande amor que o unia ao irmão fez a mesmíssima coisa. Belmiro Ferreira da Silva.
Ninguém sabe o que é feito da morena Sílvia. Meu tio casou-se com outra e deu o nome da amada à primogênita.
Meu pai a cada filho deu um sobrenome diferente. Coube somente a mim ser apenas Silva. Para homenagear minha mãe chamou-me Cassia, para honrar minha bisavó, Evangelina. Carrego a força das mulheres de minha linha materna e este Silva, resquício de um intenso amor que nunca foi vivido e jamais esquecido.

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