Há alguns anos fiz um curso com Ronilda Yakemi Ribeiro sobre Mitologia Iorubá. Fiquei encantada com a riqueza das histórias e com uma cosmogonia muito bem elaborada. Claramente fiquei fascinada pela iabás, as orixás femininas. Outro dia alguém me perguntou porque tinha uma flagrante predileção pelo pequeno conto a seguir e eu respondi que para mim, aprender a amar profundamente inclui despir-se dos artifícios da conquista e dos jogos de poder. Assim aprendeu Oxum...
Oxum fica pobre por amor a Xangô
Oxum era conhecida como a amante ardorosa.
Tinha um corpo belo, de formas finas.
Sua cintura deixava-se abraçar por um único braço.
Por muitas noites Oxum teve em seu leito amantes
aos quais propiciava momentos de raro prazer.
Oxum teve muitos amores,
de quem ganhou presentes preciosíssimos.
Oxum era rica. Tinha joias, ouro, prata,
vestidos maravilhosos, batas que causavam inveja,
e mais, pentes de marfim, espelhos de madrepérola
e tantos berloques e panos-da-costa.
Um dia chegou à aldeia um jovem tocador de tambor.
Era Xangô, um belo homem,
que desde logo atraiu o desejo de Oxum.
Inescrupulosamente, ofereceu-se a ele.
mas foi prontamente rejeitada.
Usando de todos os artifícios,
Oxum foi se aproximando de Xangô,
até que um dia ele a tomou numa calorosa relação sexual.
Mesmo assim Xangô não deixou de humilhar
e desdenhar a linda jovem.
Tempos depois,
a fama e a fortuna de Xangô lhe fugiram das mãos
e ele se viu empobrecido e esquecido
ainda que continuasse a ser excelente alabê.
Envergonhado, ele fugiu dali.
Foi viver longe do lugar e longe do som dos atabaques.
Mas continuava o glutão de sempre,
a viver com conforto e prazeres.
Oxum seguiu sendo sua amante e o consolou,
sacrificando por ele tudo o que tinha.
De tudo de seu dispôs Oxum, para o conforto de Xangô.
Primeiro as joias,depois os vestidos, as batas,
depois os pentes, os espelhos, de tudo foi se desfazendo Oxum.
Restou-lhe nada mais que seu vestido branco.
De tudo de seu desfez-se Oxum pelo amor de Xangô.
Restou a Oxum apenas um vestido branco
Que era tudo o que tinha para vestir.
Mas todo dia no rio lavava Oxum a veste branca.
De tanto lavar a única peça que lhe restara,
a roupa branca tornou-se amarela.
Desde esse dia, Xangô amou Oxum.
Prandi, Reginaldo- Mitologia do Orixás- São Paulo, Companhia da Letras, 2001.
Imagem: Sá Cortes
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